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sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A lenda de Yauara

Quando visito algum cliente novo, ou até mesmo com alunos e amigos, sempre surge a pergunta sobre o que significa o nome da minha empresa "Yauara". Primeiro surgiu da vontade de valorizar o maior tronco linguístico da américa, que é o Tupi-Guarani, depois, da pertinência com a minha idéia de mercado, de onde tirei o slogan da minha empresa: O mercado é uma selva. Aí me lembrei de uma velha lenda, contada por uma antropóloga brasileira (que não me lembro o nome) que achei numa dessas incursões cascavilhantes nesse maravilhoso emaranhado de bits chamado Internet, achei, gostei, ctrl C - ctrl V, e ficou lá no meu HD por anos, até que resolvi usar, o que foi bom, pois nunca mais achei nada a respeito dessa lenda. Por isso mesmo coloco-a aqui para a satisfação da curiosidade de meus nobres colegas internautas. Ei-la:

A Lenda de Yauara

Era uma vez uma linda princesa chamada Yamí. Sua beleza era o orgulho não só de seus pais como de toda a sua gente. Sua pele dourada, seus olhos da cor do mel, a delicadeza com que andava, parecendo mal tocar no solo, a altivez que se via não ser fruto da sua posição, mas antes inata: era ela tão graciosa que sua fama correu toda a região e chegou a margens distantes.

Quando chegou a idade em que, pelo hábito, Yamí deveria se casar, a sombra da preocupação desceu sobre a sua casa. Pois pretendentes havia, e muitos; mas ela não dava mostras de se interessar por qualquer deles. Antes, amava ficar às margens do lago à noite, contemplando a Lua e as estrelas. Eram tantos porém que a cobiçavam, e tão ferozes, que o desdém da princesa levou seu pai a anunciar um concurso destinado a escolher o mais bravo, forte e virtuoso entre eles. Alimentava a esperança de que, ao vê-los demonstrando suas qualidades, Yamí abrisse o seu coração.
No entanto, não foi o que aconteceu. Ao cair da noite, os olhos de mel se desviaram do concurso e fugiram para o interior da floresta. "Lua, Lua, me leva. Esconde-me para que ninguém me veja", suplicou a princesa. E a Lua, que era sua avó, atendeu ao seu pedido e carregou-a para bem longe.
Ao constatar o desaparecimento, seu pai mandou interromper as competições para que Yamí fosse trazida de volta. As buscas se revelaram inúteis, pois ela fora levada para a própria casa da Lua. Então um novo decreto foi anunciado: aquele que encontrasse a princesa e a trouxesse sã e salva de volta para casa seria o vencedor e se casaria com ela. Os pretendentes se lançaram à floresta imediatamente, correndo em todas as direções. Mas, como nem os melhores caçadores eram capazes de encontrar um rastro que fosse, desistiram da busca um a um.
Havia, porém, um guerreiro chamado Yauara. Tinha sido um dos mais destacados nas primeiras provas e o amor que há muito tempo sentia pela princesa o impedia de abandoná-la. Lembrou-se das muitas vezes em que a seguira, sem deixar que o visse, e a contemplara à luz azulada da noite. Guiado por seu coração, seguiu a trilha do luar até o amanhecer. Pouco antes dos primeiros raios da aurora, viu onde a Lua se escondia. Para lá se dirigiu e encontrou Yamí adormecida, ao lado de sua avó. Tomou-a nos braços, com o máximo cuidado, e levou-a de volta.
Yamí acordou na casa de seu pai, surpresa e irritada. Mais irritada ainda ficou quando soube que sua mão estava prometida a Yauara. "Amo apenas a noite", disse a ele. "Se me quiseres como mulher, terás antes de tomar para teu corpo o negrume do céu, e para teus olhos o brilho das estrelas. Terás de ser belo e misterioso como a madrugada".
Yauara ficou triste. Aventurara-se a buscar a princesa não tanto para tê-la, mas por preocupação. E, no lugar de gratidão, recebia desprezo. No entanto, da mesma forma que antes, não desistiu. E, naquela noite, implorou à Lua que o ajudasse. A Lua se comoveu com o amor do guerreiro, que muitos perigos enfrentara em sua busca. E o transformou num grande felino, de pele negra como o céu na noite fechada, e olhos brilhantes como duas estrelas. E foi dessa forma que Yauara se apresentou novamente a Yamí. A princesa se amedrontou e tentou se recusar mais uma vez. Porém, Yauara não aceitava mais desculpas. Tomou Yamí e a levou para a floresta, onde a Lua a transformou também numa pantera.
Os dois tiveram um filho. Sua pele era dourada como a da mãe, com pintas negras da cor do pai. Andava pelas matas com leveza, sem um ruído sequer, mas também rugia como quem se sabe de estirpe real. Amava a noite, quando saía para caçar, protegido pela Lua e pela obstinação que herdou do pai. Foi a primeira Onça Pintada, e brilhavam como estrelas os seus olhos da cor do mel.


FIM